Festa das Cabacinhas

 

Por Evonaldo Andrade

 

Postado pela primeira vez numa segunda-feira, 14 de janeiro de 2013, 01h40min.

A Festa das Cabacinhas (Festa da Capelinha)

            Em Lendas de Piripiri III, o leitor deste almanaque conheceu a incrível história de “O Galo da Apertada Hora”, que aterrorizava os fiéis de Nossa Senhora do Rosário. A procissão, em adoração a Nossa Senhora do Rosário, tinha como destino a Capela de Nossa Senhora dos Remédios. 

            A primeira Capela de Nossa Senhora dos Remédios (construída entre os anos de 1840 a 1844) situava-se no “meio” da Rua João de Freitas. Foi nessa capela que foi sepultado o corpo do Padre Freitas, em 1868. Essa capela foi demolida, construindo-se outra, em 1876, ao lado da casa do fundador de nossa cidade, na Rua João de Freitas. No local da primeira capela, foi erguido um monumento em homenagem ao Padre Domingos de Freitas e Silva. O monumento, com o tempo, tornou-se um empecilho para o trânsito e, por essa razão, foi demolido. 

            A segunda capela foi também demolida e, em seu lugar, ergueu-se uma nova capela em homenagem a Nossa Senhora do Rosário, em 1940. 

            Foi, esse pequeno pedaço de rua chamado de “rua meia-sola”, o palco para as alegres e emocionantes “Festas das Cabacinhas”, um empolgante  festejo em honra a Nossa Senhora do Rosário e  que remonta à época da primeira Capela de Nossa Senhora dos Remédios, na Rua João de Freitas. 

            Nossa Senhora do Rosário era representada por bonita imagem (pertencente a Domingos Preto, proprietário, à época, da localidade Salgado). Domingos herdara a imagem de sua mãe, que também patrocinava a festa.

            Em certa ocasião, Dona Carola Freitas pedira a Domingos Preto para guardar a imagem da santa em sua casa. Domingos consentiu, mas “deixou bem claro” que se a mesma falecesse primeiro que ele (Domingos) a imagem retornaria ao seu poder. Há quem diga que houve uma transação entre Domingos Preto e um membro da família Freitas. Ao que se sabe, a imagem  ficou em poder da família de  Dona Carola Freitas e os herdeiros de Domingos Preto nunca questionaram sua posse.

            Nessas festividades (realizadas nos primeiros anos de Peripery), escolhia-se um rei e uma rainha (entre os negros). O escravo Salomão foi um dos primeiros reis. 

            Pulquéria (negra muito bonita) foi uma das últimas rainhas. A bela Pulquéria vivia na casa do Coronel Antonio Alves Ferreira (pai de Aderson Ferreira). Pulquéria era ama de Odilon (nascido em 1899).

            A Festa das Cabacinhas iniciava-se em setembro. A imagem de Nossa Senhora do Rosário saia peregrinando pelo interior de Peripery, nas fazendas e povoados vizinhos. Os negros entoavam benditos (orações).

            A peregrinação chegava ao Sítio Anajás no dia 27 de dezembro, onde a imagem era calorosamente recebida (ver lenda “O Galo da Apertada Hora”). Os fiéis seguiam em procissão à capela de Nossa Senhora dos Remédios. Os encarregados traziam cestas com ofertas: verduras, frutas, além de dinheiro e animais. Na tarde do dia 28, os devotos visitavam as principais casas da vila, cantando:

            À noite (do mesmo dia 28 de dezembro) começavam os festejos, terminando no dia 06 de janeiro (Dia de Reis). As nove noites de novena atraiam centenas de moradores da vila e região vizinha. Os leilões eram bastante concorridos. Os sacristãos da paróquia encarregavam-se de “gritar” o leilão. Bidoca Pinheiro era conhecido leiloeiro. Famoso por sua simpatia e pelo costume nada comum de quebrar um ovo cru e engolir a gema, para ter forças para anunciar as joias.

            O ponto forte da festa era a brincadeira das cabacinhas. Os jovens atiravam as cabacinhas nas pessoas. As cabacinhas eram preparadas pelas moças da cidade. Para confeccioná-las, usavam cera branca  e anilina azul. As cabacinhas, quando prontas, adquiriam a cor azul-esverdeada e eram “recheadas de água perfumada”.

            Alguns estudantes aprenderam a fabricar as cabacinhas, mas enchiam-nas de tinta sardinha (uma marca de tinta preta usada em canetas-tinteiro). Essa brincadeira dos estudantes causava aborrecimentos nas pessoas, que tinham as roupas manchadas de tinta preta. Acredita-se que esse tenha sido o motivo para o fim da brincadeira.

            E hoje, a Capelinha de Nossa Senhora dos Remédios não existe mais, não há mais a Festa das Cabacinhas... E a imagem de Nossa Senhora do Rosário? Segundo João Carlos Souza, até 1984, a imagem de Nossa Senhora do Rosário esteve aos cuidados de Dona Maria, esposa do Dr. Bandeira.

O que se sabe mesmo é que Piripiri perdeu a mais original de suas festas, a “Festa das Cabacinhas”.

Obs.: Segundo Monsenhor Chaves, em 1882, havia, em todo o Piauí, 21.691 escravos, sendo 203 em Piripiri.

Obs2.: A Festa das Cabacinhas (que em Piripiri terminava no Dia de Reis) ainda é comemorada em poucas cidades brasileiras, algumas com início no Dia de Reis.

 

Crédito textos, informações e imagens: Livros “Piripiri” e “O Padre Freitas de Piripiri” – Judith Santana; Memórias de Piripiri – Cléa Rezende Neves de Mello; Mons., Chaves – Obra Completa. Fotos colhidas em “blogdocatete.blogspot.com.br”; Piripiri – Banco do Nordeste do Brasil S.A.; Mercado Livre e Facebook de Fabiano Melo.