A Botija do João Ciriaca (não é lenda)

 

Por Evonaldo Andrade

 

Postado pela primeira vez num sábado, 19 de janeiro de 2013, 01h27min.

Um segredo nunca descoberto

 Ciriaca, um pacato cidadão piripiriense, levava uma vida tranquila e sem maiores ambições. Trabalhava no bar do Sr. Gonçalo Pinto Magalhães (Gonçalinho), fabricava vasos e outras peças de cimento, criava porcos, tratando-os carinhosamente e chamando cada animal pelo nome. news.

            A monotonia de sua vida só foi quebrada quando começou a sonhar com um tesouro que estaria enterrado no quintal do bar do Sr. Gonçalinho, que além de proprietário de bar, era sacristão.

            João Ciriaca sonhara três noites com a botija, mas teria que guardar segredo, ir sozinho, usar um cavador de pau, velas e rosário.

            João Ciriaca, apesar de advertido pela alma, contara a “notícia” para muitas pessoas. Houve quem não acreditasse na história, achando que Ciriaca desconfiara de alguma coisa enterrada no quintal do bar e, por isso, inventara os sonhos.

            O bar do Sr. Gonçalinho funcionava dia e noite, na Rua Major Antônio Albino, numa casa (já demolida) em que morou, anos depois, o próprio João Ciriaca. O imóvel ficava de frente para a casa de seu Hamilton (hoje, o Educandário Christus).

            Além de João Ciriaca, havia outro funcionário, o Alfredo. Os dois, movidos pela ambição, na calada da noite, aproveitando que o bar estava fechado e os vizinhos dormiam, começaram a cavar no lugar indicado por João. A surpresa foi decepcionante, em vez de um baú cheio de moedas de ouro, encontraram a imagem de Nosso Senhor Bom Jesus dos Passos.

            Se a decepção de João Ciriaca foi grande, o medo de Alfredo foi muito maior. O pobre Alfredo, supersticioso, saiu correndo pelas ruas da cidade, parando, sem fôlego, no bar do Sr. Domingos Freitas, ainda aberto, apesar da hora avançada.

            O bar do Sr. Domingos Freitas, situado na casa do Padre Freitas, era o “point” da juventude. Além de ser um bar de esquina para a praça, fora o primeiro a adquirir um balcão para a venda de sorvetes e picolés. 

            O Apavorado Alfredo, bastante exausto, conta a misteriosa aventura a Domingos e Capitão Freitas, que se dirigem ao local, encontrando João Ciriaca, assustado e aturdido, contemplando a imagem de Nosso Senhor Bom Jesus dos Passos.

            A imagem, em tamanho natural, além de bastante desgastada, estava com as pernas e braços quebrados.

            Mas... afinal, que imagem é essa? De onde veio e o que estava fazendo ali? No quintal do bar do sacristão Gonçalinho. 

NOSSO SENHOR BOM JESUS DOS PASSOS

            A imagem de NOSSO SENHOR BOM JESUS DOS PASSOS foi doada pelo fundador da cidade e estava em nossa paróquia desde, pelo menos, 1857.

            Entre 1918 e 1928, esteve à frente da paróquia o Padre Joaquim Nonato Gomes. O padre e o sacristão Gonçalinho, não se sabe por qual motivo, foram os responsáveis pelo “enterro” do santo.

            A imagem foi recuperada e as chuvas retornaram acabando com uma longa estiagem.

            Depois de restaurada, a imagem de Nosso Senhor Bom Jesus dos Passos foi colocada na Capela de Nossa Senhora do Rosário.

            A notícia de uma imagem bonita e antiga, exposta em Piripiri, chamou a atenção do colecionador Josias Clarence Carneiro da Silva, que pagou (ao Frei Ivo) a insignificante quantia de cem cruzeiros. Vale lembrar que, no ano em que Frei Ivo deixou nossa paróquia  (1967), o salário mínimo  custava NCr$ 105,00 (cento e cinco cruzeiros novos).

            A imagem de Nosso Senhor Bom Jesus dos Passos foi levada para o “Museu Carneiro da Silva” e hoje se encontra exposta na Casa de Cultura, em Teresina-PI.

            Nosso Senhor Bom Jesus dos Passos não foi o primeiro santo “enterrado” em nossa cidade.

O SANTO ANTÔNIO DE DONA RITINHA

            Piripiri, começo do Século XX, trabalhadores, a serviço de Domingos Coelho de Melo Rezende (Sr. Bugy),  retiravam pedras num terreno localizado na Praça da Bandeira, entre os nºs  167 e 191 (provavelmente onde está edificado o prédio da extinta Telepisa). As pedras seriam utilizadas na construção de algumas casas, entre elas, a do Sr. Bugy.

            Entre as pedras quebradas, uma chamou a atenção dos cavouqueiros. Preso ao fragmento, uma cabeça de santo. Muito se especulou sobre a cabeça encontrada, sendo, por fim, identificada e creditada a Santo Antônio.

            Mas o que fazia ali enterrada a cabeça de Santo Antônio. Teria sido vingança de alguma noiva desiludida?

            Passado o espanto, trataram logo de “aproveitar o achado”. A cabeça foi entregue a Dona Ritinha (Rita Rosa  de Araújo Rezende), esposa do Sr. Bugy, que mandou confeccionar um corpo para a cabeça do santo. 

            Dona Ritinha, admirada com o belo trabalho do artesão, expôs a imagem em casa, atraindo uma inesperada multidão de devotos. A cada milagre alcançado, os fiéis retribuíam a graça, ofertando dinheiro ou algum animal.

            Por sugestão de Dona Ritinha, o dinheiro ofertado e arrecadado com a venda dos animais foi  utilizado uma parte na restauração da igreja (construída em 1884, precisando ser reformada urgentemente) e outra na aquisição de uma nova imagem de Nossa Senhora dos Remédios, em substituição à primeira, que ficaria exposta na Capela de Nossa Senhora do Rosário.

            Em 1909, a nova imagem de Nossa Senhora dos Remédios (1,70 m) desembarca em Parnaíba e é conduzida em procissão contínua até Piripiri. O cortejo não parou em nenhum momento, nem durante a noite! Havia sempre um grupo  de fiéis esperando a sua vez de transportar a santa.

            A chegada de Nossa Senhora dos Remédios em Piripiri foi bastante comemorada. O povo estava feliz, o povo sabia que Nossa Senhora, a mãe de Nosso Senhor, também é a mãe do povo de Piripiri.

 

 Crédito textos, informações e imagens: Livros “Piripiri” e “O Padre Freitas de Piripiri” – Judith Santana; Memórias de Piripiri – Cléa Rezende Neves de Mello. Fotos: acervo próprio; acervo de Francisco Randolpho; facebook de Fernando Rezende Neves de Melo; Imagens escaneadas de páginas do Livro "O Padre Freitas de Piripiri", de Judith Santana.