Por que a propagação de notícias falsas é um problema de tecnologia

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A notícia costumava ser confiável. Apesar da "falsa notícia" sempre ter existido, desfrutamos de um relativo período de paz na segunda metade do século XX, onde os meios de comunicação nas democracias produziam uma realidade confiável e compartilhada. 

 
As pessoas discordavam, mas as suas opiniões se baseavam principalmente em fatos críveis produzidos por padrões sólidos de jornalismo, verificação de fatos e integridade editorial. 
 
Em seguida, a web chegou, seguido pela web social. Agora, em vez de três fontes de notícias respeitáveis, você ouve fatos e ideias de milhares de fontes de confiabilidade variável. Estas aparecem diante de seus olhos por meios invisíveis - pela compatibilidade do conteúdo com os algoritmos secretos utilizados para determinar o que se espalha amplamente - e o que não.  
 
Uma ampla gama de pessoas com interesses políticos, comerciais ou antissociais têm desenvolvido as suas técnicas para brincar com algoritmos sociais visando acelerar a difusão de notícias falsas. Algo que Dana Boyd chama de "hackear a economia da atenção". 
 
Por que as notícias semi-falsificadas são as piores  
 
Aqui está o problema: notícias falsas soam ridículas e, como tais, inofensivas. O pior tipo de notícia falsa é uma exportação russa chamada "disinformatzya". 
 
O jornalista do The Guardian e especialista russo Luke Harding diz que as táticas do "disinformatzya" do Kremlin foram aperfeiçoadas pelo KGB durante a guerra fria. Elas têm existido há décadas, mas apenas na Rússia. 
 
O que é novo é que nos últimos anos a Rússia tem aplicado a disinformatzya para o público em língua inglesa. Nós não estamos acostumados ao método, e por isso é extremamente eficaz. 
 
O objetivo da disinformatzya não é levar as pessoas a acreditarem em mentiras, mas "confundir e enganar todos os outros por meio de teorias de conspiração flutuantes, então há 10 explicações diferentes para um evento", disse Harding em entrevista a Terry Gross da NPR. 
 
O governo russo faz isso através da publicação de notícias "semi-falsas" e também "contratando exércitos de trolls", que espalham informações errôneas e interrompem conversas online com mensagens abusivas e odiosas, evitando conversas racionais. 
 
Dentro da Rússia, a disinformatzya procura erodir a confiança em todas as instituições para que um "homem forte" como Putin possa se apresentar como a única solução.  
 
Fora da Rússia, a técnica ajuda o país a desestabilizar e enfraquecer os rivais, ao mesmo tempo que permite ao líder russo convencer o seu povo de que o Ocidente é tão corrupto e disfuncional quanto a Rússia.  
 
A pior parte é que essa tática manipuladora de usar disinformatzya para deliberadamente criar confusão e estrago funciona. E por isso, está sendo instintivamente pego por organizações americanas e europeias, trolls e políticos. Isso é o que há de novo. É por isso que "notícias falsas" se tornaram um grande problema agora.  
 
Não há dúvida de que o termo "fake news" é uma "tendência" agora. Para você ter uma ideia, o dicionário de Macquarie de Austrália nomeou "notícias falsas" como sua "palavra do ano." 
 
A CNN lançou uma iniciativa não para criar notícias falsas, mas para pesquisar, relatar e expor. Os governos da Alemanha, Canadá, República Tcheca e outros países estão criando comissões de revisão e comitês para enfrentar o problema das falsas notícias. Estes esforços são bons, mas não terão o efeito desejado, porque não afetam a propagação das notícias equivocadas em sites sociais. 
 
A pergunta que fica é seria a falsa notícia culpa da tecnologia? E, portanto, a tecnologia pode corrigi-la?
 
O que o Vale do Silício pode fazer 
 
O problema da notícia falsa tem se tornado tão grave ultimamente que empresas do Vale do Silício e outras estão lutando para criar soluções tecnológicas para um problema, bem, criado pela tecnologia. 
 
O Google anunciou esta semana que havia banido cerca de 200 editores de sua rede AdSense. A companhia não publicou uma lista de sites proibidos, que resultou de uma alteração na política sobre conteúdo enganoso, mas adicionou uma categoria para sites que representam notícias. 
 
Enquanto a palavra "proibição" soa forte, fato é que o Google está apenas retendo seus serviços de publicidade a partir desses sites, que são livres para prosseguir outras oportunidades de publicidade. 
 
O Facebook, por sua vez, informou que atualizou seu serviço de "Tendências" na tentativa de reduzir a viralização de notícias falsas. E tomou uma abordagem interessante, inclusive. Algoritmos do Facebook agora "expulsam" notícias que vêm de uma única fonte e que viralizam. A não ser que um artigo tenha obtido capturas (histórias originais baseadas em outras publicações) de outros artigos, ele não será permitido na seção Tendências. 
 
Infelizmente, isso parece ser fácil de burlar. Sites de notícias falsas precisam apenas publicar vários sites, e criar captadores em seu próprio conteúdo - algo que muitos sites de notícias falsos já fazem. 
  
O jornal francês Le Monde construiu um banco de dados chamado "Decodex", que contém 600 sites de notícias falsas e será lançado  em fevereiro. 
 
O banco de dados foi compilado pelos verificadores de dados da publicação. A maioria dos sites são falsos, mas sites estrangeiros como o "Breitbart" da América e o "Daily News Bin" também estão no banco. 
 
Os usuários podem colar as URLs para ver se uma notícia online é falsa ou, melhor ainda, usar uma extensão do Chrome ou Firefox que alerta os leitores com um sistema codificado por cores. 
 
O Le Monde ainda planeja lançar um bot do Facebook Messenger para verificação de fatos, uma abordagem que pode ser eficaz. 
 
Um estudante da Universidade de Stanford de 19 anos, Karan Singhal, criou um "detector de notícias falsas" usando inteligência artificial. A solução analisa 55 métricas diferentes, incluindo estilo de escrita, layout e nome de domínio. Você pode experimentá-lo gratuitamente
 
Uma das ações mais agressivas vem da Snap, empresa por trás do Snapchat. A companhia atualizou suas diretrizes de conteúdo para que os editores do Snapchat lutem contra as notícias falsas, de acordo com um relatório no New York Times desta semana. 
 
Isso porque antes de uma IPO esperada, a Snap quer reduzir o clickbait. A seção "descoberta" do Snapchat agora proíbe a blasfêmia, conteúdo sexual ou violento e manchetes enganosas ou fraudulentas. 
 
Mas a Snap também alveja notícias falsas. A empresa diz que todo o conteúdo deve ser verificado e preciso e que os editores não podem personificar entidades ou pessoas. Não está claro como a Snap irá policiar as diretrizes. Mas na medida em que eles são policiados, eles estão entre os mais rigorosos de todas as redes sociais. 
 
Fato é que a Snap está fazendo a coisa certa ao dizer: Nós somos um editor. Somos responsáveis ​​pelo conteúdo. E essa é a única política responsável.
 
O que não fazer 
 
Recentemente, uma série de análises apontou que notícias falsas não determinaram o resultado das eleições norte-americanas e, portanto, não devemos nos preocupar com elas. 
 
Mas quem quer viver em um mundo, onde as pessoas acreditam que o jornalismo é falso, enquanto propaganda, teorias de conspiração e notícias falsas são verdade; onde a investigação científica é considerada política, mas reivindicações por políticos sobre a ciência não são? 
 
É hora de o Google, Facebook e Twitter ficarem sérios. As notícias falsas podem e devem ser identificadas, banidas, destituídas de privacidade, rotuladas ou desabilitadas. A única coisa que pode nos salvar do flagelo das falsas notícias e da "disinformatzya" é o Vale do Silício.
 
Fonte: IDGNOW!